Pastor evangélico leva tiro na cabeça em ocupação do MST na Zona Sul do Recife

De acordo com Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, quatro homens invadiram a ocupação, localizada às margens da BR-101, no bairro do Jordão, agrediram pessoas e dispararam contra o religioso.

Por Suzana Souza*, G1 PE

 


Pedaço de projétil encontrado no local onde houve os diparos no domingo (18), na Zona Sul do Recife — Foto: MST/Divulgação
Pedaço de projétil encontrado no local onde houve os diparos no domingo (18), na Zona Sul do Recife — Foto: MST/Divulgação

Um pastor evangélico levou um tiro na cabeça em uma ocupação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), nas margens da BR-101, no bairro do Jordão, na Zona Sul do Recife. De acordo com integrantes do movimento, quatro homens invadiram o local na noite do domingo (18), agrediram pessoas e dispararam contra o pastor.

O acampamento, denominado de Nelson Mandela, foi ocupado pelo MST em 12 de junho deste ano. Segundo o movimento, 300 famílias moram nos 270 apartamentos não finalizados, divididos em 16 blocos. O empreendimento começou a ser construído em 2012 e é de competência da Companhia Estadual de Habitação e Obras (Cehab).

"A gente estava reunido na frente da ocupação por volta das 18h. O irmão que foi atingido tinha ido lá nos visitar, ele é de outro acampamento. De repente, os caras entraram gritando que eram da polícia", contou o dirigente da ocupação José Severino.

Segundo Severino, os quatro homens que invadiram a ocupação estavam armados e obrigaram ele, o pastor, que preferiu não se identificar, e outras cinco pessoas que estavam no local a entrarem dentro de um dos apartamentos localizados no térreo.

Pastor evangélico, que preferiu não ser identificado, foi baleado na cabeça na noite do domingo (18), em uma ocupação do MST, na Zona Sul do Recife — Foto: MST/Divulgação
Pastor evangélico, que preferiu não ser identificado, foi baleado na cabeça na noite do domingo (18), em uma ocupação do MST, na Zona Sul do Recife — Foto: MST/Divulgação

"Deram chutes no meu rosto e foram para perto do pastor. Mesmo ele orando, pedindo para que tivessem calma, atiraram na cabeça dele e ele começou a sangrar lá dentro mesmo, pedindo socorro", relatou Severino. Além deles, outro homem foi agredido com chutes, segundo o dirigente.

O pastor foi socorrido para a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Lagoa Encantada, na Zona Sul, e depois transferido para o Hospital da Restauração, na área central do Recife, conforme relatou o MST.

A reportagem não teve acesso ao nome da vítima, por isso não pôde solicitar informações sobre seu estado de saúde à unidade hospitalar. No entanto, por meio de vídeo enviado na segunda-feira (19) ao MST, a vítima relatou que está lúcida.

"Estou aqui dentro da Restauração em observação com a cabeça toda enfaixada, o nariz cortado, a sobrancelha cortada. [...] Não estou podendo fazer minhas necessidades, tanto defecar como urinar, porque não estou sentindo as minhas pernas. Se eu ficar em pé eu caio, porque não sinto", disse o homem.

Denúncia do MST

Integrantes do MST ocuparam o habitacional localizado na BR-101, na Zona Sul do Recife, em 12 de junho deste ano — Foto: MST/Divulgação
Integrantes do MST ocuparam o habitacional localizado na BR-101, na Zona Sul do Recife, em 12 de junho deste ano — Foto: MST/Divulgação

De acordo com Severino, outros membros da ocupação foram intimidados dias antes da tentativa de homicídio. "A gente vem sendo perseguido. Carro estranho andando do lado da gente, falando para a gente ter cuidado por onde anda", relatou.

Ainda de acordo com o MST, policiais militares chegaram ao local após a tentativa de homicídio, mas não deram assistência aos integrantes ocupação. "Chegou a polícia em uma viatura, mas não quiseram ficar lá, não deram muita atenção. E depois a polícia foi para a UPA sem identificação, ameaçando a vítima, falando que era vagabundo", afirmou o dirigente estadual do MST Paulo Mansan.

De acordo com ele, o movimento deve registrar um boletim de ocorrência na Polícia Civil nesta terça-feira (20), após reuniões internas entre integrantes e advogados. Ele afirmou que o grupo estuda a melhor forma de lidar com o caso, porque teme represálias pela denúncia.

"As resoluções principais foram que a resistência e a ocupação continuam, não vamos ser intimidados. Vamos ter reuniões com a secretaria de segurança do estado, porque a postura da polícia que foi lá não é condizente com a de um agente de estado. Nós queremos respostas", relatou.

Integrantes da ocupação em reunião feita na tarde da segunda-feira (19) — Foto: MST/Divulgação
Integrantes da ocupação em reunião feita na tarde da segunda-feira (19) — Foto: MST/Divulgação

Resposta da PM

Por meio de nota, a Polícia Militar (PM) afirmou que foi acionada para o local e que "pelas primeiras informações obtidas, não há ligação do crime com conflito agrário ou habitacional".

Segundo o texto, "três ou quatro homens chegaram a uma invasão ao lado da escola técnica do bairro se dizendo policiais e ao encontrar a vítima, no apartamento onde estava, perguntaram onde era a boca de fumo".

Ainda de acordo com a corporação, "uma viatura do 19º BPM, que esteve no local do crime, se deslocou até a UPA e acompanhou a transferência para garantir a integridade do paciente".

A polícia informou que ele conversou com os policiais e contou que "foi à invasão a convite de um outro popular, com a promessa de ganhar um dos apartamentos do movimento".

Obras do habitacional

O MST informou que teve uma reunião com a Cehab em 29 de junho deste ano. De acordo com a ata de reunião, ficou decidido que os ocupantes deveriam sair do local até o dia 4 de julho. Após a desocupação, a Cehab faria "uma doação para a entidade do MST, de terreno localizado ao lado do habitacional ou de parte do terreno".

O grupo, no entanto, não deixou o local. "Deram para a gente 58 pequenos terrenos para tirar o pessoal da ocupação e recomeçar a obra. Só que pela quantidade de pessoas que se tinha no momento não dava", afirmou Severino.

Obras do habitacional começaram em 2012, de acordo com Cehab — Foto: MST/Divulgação
Obras do habitacional começaram em 2012, de acordo com Cehab — Foto: MST/Divulgação

Por meio de nota, a Cehab falou que as obras do local não estavam paradas e que "desde 2019 tem uma empresa trabalhando na construção do habitacional".

"A estrutura está erguida, a parte grossa da alvenaria está de pé, mas tudo já meio deteriorado por conta do tempo. Porque faz muito tempo que está parado, o governo diz que está retomando, mas tem famílias cadastradas que estão na fila há mais de 15 anos", afirmou Mansan.

Ainda na nota do estado, a Cehab afirmou que "a negociação da troca do acampamento tinha como objetivo desocupar os imóveis para dar continuidade aos trabalhos de conclusão do habitacional".

A previsão de finalização das obras é junho de 2022. A companhia informou que 272 famílias estão cadastradas para serem contempladas com os apartamentos e que elas recebem um auxílio-moradia no valor de R$ 200.

Sobre o atraso nas obras, a Cehab informou que entre os motivos estão o "abandono de contrato por parte de outras empresas, prazo para contratação de novas empresas, invasões e depredações da obra. O local já passou por outros tipos de disputa".

* Estagiária sob a supervisão de Luiza Mendonça, editora do G1 PE.

VÍDEOS: Mais assistidos de PE nos últimos 7 dias